Na ilha
de Santo Antão o recorte da montanha e os seus picos alcantilados desenham uma
linha incerta com que a terra se separa do céu. Em função da hora do dia, do
estado do tempo e do local de onde a observamos obteremos imagens unicas e
sempre diferentes: a transição do castanho da terra ressequida para um azul que
se prolonga no mar, o esbranquiçado das névoas obtido no mesmo local onde
poderemos captar, mais tarde, o preto esfumado de um contra-luz quando a tarde
começa a fugir.
Os vales profundos, de cortar a respiração, foram escavados
por ribeiras tormentosas, em dias de Chuva Brava; estas ocasionais e agressivas
levadas dão lugar, no instante imediato, a talvegues sem água, para onde olham,
angustiados, os Flagelados do Vento Leste. As
ribeiras passam a desempenhar, então, outra função: viram a estrada que liga os
pequenos lugares dispersos ao longo do vale, transformam-se em caminhos que as
autoridades, aos poucos, vão melhorando. Aqui, os rios têm dias, melhor, têm
estações: em função disso alimentam ora uma agricultura no limite da
subrevivência ora deixam, no seu seio, circular pessoas e automóveis.
Ninguém
como Manuel Lopes melhor descreveu esta saga, o esforço do agricultor para
retirar da terra alguns grãos de milho em socalco que são um hino ao esforço do
homem nas montanhas de Santo Antão. Se os socalcos das vinhas Douro e as Vinhas
da Ilha do Pico nos Açores foram consideradas Património da Humanidade, pelas
paisagens que proporcionam, que se poderá dizer dos construidos pelos
agricultores das Ilha de Santo Antão. Encontramos uma diferenças: os primeiros
foram construidos para produzir vinho enquanto os caboverdianos fizeram-nos para
assegurar a sua sobrevivência à custa do milho que deles retiravam.
Em
memória do esforço do homem nas montanhas de Santão Antão.